quarta-feira, abril 04, 2007

O MEIO RURAL E O URBANO


30 de janeiro de 2007
por Geomundi


Somente a sociedade humana “habita” o planeta, no sentido de transformá-lo segundo um objetivo pré-determinado. As metamorfoses do espaço habitado acompanham a maneira como a sociedade humana se expande e se distribui, acarretando sucessivas mudanças demográficas e sociais em cada continente (mas também em cada país, em cada região e em cada lugar). O fenômeno humano é dinâmico e uma das formas de revelação desse dinamismo está, exatamente, na transformação qualitativa do espaço habitado.

A noção de distribuição espacial da humanidade, se considerada apenas em relação às condições naturais, é insuficiente. O hábitat, isto é, o espaço construído pelo homem, era antigamente o seu lugar de residência e de trabalho, e o espaço destinado às relações que uma vida social geograficamente confinada gerava, por meio do processo produtivo, tanto nos seus aspectos materiais como nos seus aspectos não materiais.

Considerando a totalidade da superfície terrestre, aparecem grandes espaços que estão quase vazios: são as zonas polares e as terras submetidas durante sete ou oito meses a temperaturas muito baixas, ou ainda, as regiões de grande altitude. As extensões quentes e secas também formam parte do conjunto muito debilmente povoado. A Amazônia (América do Sul) e o Congo (África) não contam, em média, com mais do que 2 ou 3 habitantes por km² . Ao contrário, na Ásia encontram-se regiões de clima quente e úmido fortemente povoadas. E as mesmas desigualdades ocorrem nas zonas temperadas.

Para explicar esses contrastes de concentração de população é necessário fazer as distinções abaixo.

Grandes regiões industriais: cujo povoamento mais importante data do século XIX. Sua ocupação foi provocada pelos efeitos da Revolução Industrial, determinando uma concentração maciça da população nas cidades.

Grandes regiões agrícolas: nas quais também existem desigualdades de povoamento por causa das condições geográficas e históricas.

No decorrer dos séculos, tanto o crescimento econômico como o crescimento demográfico foram muito lentos em todos os países. Até o século XIX, os homens eram essencialmente agricultores.

Mas, a partir desse século, ocorreu uma transformação demográfica cujos múltiplos efeitos passaram a ter importância cada vez maior, como conseqüência das mudanças econômicas, sociais, políticas e culturais que se produziram desde o início do século XIX, a cujo conjunto se denominou Revolução Industrial. A partir de então, a agricultura se transformou; o comércio e os meios de transporte sofreram grande impulso. As cidades se multiplicaram e passaram a ser cada vez mais importantes.

A divisão entre os setores primário (agricultura e pecuária), secundário (indústria) e terciário (comércio e serviços) aprofundou-se em escala mundial, e a população economicamente ativa (aquela efetivamente engajada na economia) empregada no setor secundário passou a assumir importância cada vez maior na força de trabalho mundial.

Cerca de 2,5 bilhões de homens e mulheres vivem nas zonas rurais de todo o mundo, e 2 bilhões deles são camponeses que cultivam cerca de 1,5 bilhões de hectares, ou seja, aproximadamente 10% das terras emersas. Mas a distribuição das riquezas de que dispõem esses diferentes grupos não corresponde à distribuição da população.

Boa parte dos meios de produção está concentrada em países que contam com uma agricultura muito produtiva, concentrando também a produção industrial. Esses países possuem, ainda, potencial científico e tecnologia avançada.

A agricultura, hoje, não é mais a atividade principal dos países desenvolvidos. No entanto, continua sendo o meio de vida da maioria dos habitantes dos países subdesenvolvidos.

A partir do século XIX, a agricultura sofreu grandes modificações em conseqüência da transformação dos modos de produção no espaço, passando de uma agricultura de subsistência para uma agricultura comercial. Mas, em muitos casos, os camponeses que têm de cultivar para a exportação não conseguem preço suficiente para os produtos de seu trabalho nem chegam a produzir o suficiente para sustentar a família.

As atividades agrícolas praticadas por povos diferentes são extremamente variadas. Existem vários sistemas de cultivo, isto é, o conjunto de técnicas empregadas numa exploração agropecuária e de utilização do solo.

Também temos de levar em conta as diferenças de estrutura agrária. Elas se distinguem nas formas de propriedade da terra (propriedade coletiva, pequena propriedade privada, grande propriedade privada), cujas colheitas podem ficar com o proprietário ou ser repartidas entre o proprietário e os cultivadores.

Às vezes a terra pertence a quem a trabalha, seja um grupo social (propriedade ou exploração coletiva) ou uma pessoa (pequeno proprietário). Na maioria dos casos, porém, a terra não pertence a quem a cultiva.

Hoje, os sistemas agrícolas dos países desenvolvidos são, geralmente, intensivos e de produtividade alta, pois os meios técnicos aplicados na produção são consideráveis e apresentam grandes investimentos de capitais. A aplicação desses capitais tem como objetivo prover determinado produto; e a busca dos lucros é o que determina a combinação de cultivos escolhida, sem perder de vista as demandas do mercado.

Como conseqüência da expansão européia em áreas escassamente povoadas, a agricultura dos países “novos” (Estados Unidos, Canadá, Argentina, Austrália) nasceu quase ao mesmo tempo que a Revolução Industrial, que foi lhes fornecendo os meios técnicos para valorizar os imensos espaços agrícolas disponíveis.

A instalação da agricultura comercial nos países tropicais, destinada a abastecer os países industrializados, adquiriu a forma de grandes plantações coloniais. As maiores plantações se encontram na América Latina, que oferece produtos de grande valor no mercado internacional. No entanto, as populações que nelas trabalham são muito pobres, já que a colheita pertence a grandes proprietários.

O aumento populacional e o desenvolvimento têm vínculos complexos. No passado, por meio da intensificação da agricultura e do aumento da produtividade, as nações puderam enfrentar as crescentes pressões populacionais sobre a terra disponível.

A pressão populacional já está forçando os agricultores tradicionais a trabalharem mais, quase sempre em fazendas cada vez menores, situadas em terras marginais, apenas para manter a renda familiar. Na África e na Ásia, a população rural praticamente dobrou entre 1950 e 1985, com um correspondente declínio na disponibilidade de terra. O rápido aumento populacional também cria problemas urbanos de cunho econômico e social, que ameaçam impossibilitar a administração das cidades.

O aumento populacional acelerou-se em meados do século XVIII, com o advento da Revolução Industrial e das correspondentes melhorias na agricultura, não só nas regiões mais desenvolvidas como também em outras. A fase recente de aceleração começou por volta de 1950, quando as taxas de mortalidade tiveram redução acentuada nos países em desenvolvimento.

Hoje, o aumento populacional concentra-se nas regiões subdesenvolvidas da Ásia, da África e da América Latina, responsáveis por 85% do aumento da população mundial a partir de 1950.

O aperfeiçoamento das comunicações possibilitou grandes deslocamentos de pessoas, às vezes como uma reação natural ao aumento das oportunidades econômicas em determinadas áreas. Isso aumentou rapidamente a mobilidade da população, acelerando as migrações internas e externas.

Grande parte dos deslocamento dá-se do campo para a cidade. Em 1985, cerca de 40% da população mundial vivia em cidades. A magnitude da migração para as cidades é comprovada pelo fato de que, a partir de 1950, o aumento população urbana foi maior que o aumento da população, tanto em termos percentuais como absolutos.

Esse deslocamento é mais impressionante nos países em subdesenvolvidos, nos quais o número quadruplicou nesse período.

No final deste século, quase metade do mundo estará vivendo em áreas urbanas desde pequenas cidades até megalópoles. O sistema econômico mundial está se tornando cada vez mais urbano, com redes justapostas de comunicações, de produção e de mercadorias.

Tal sistema, com seus fluxos de informação, energia, capital, comércio e pessoas, gera a coluna dorsal do desenvolvimento nacional. As perspectivas de uma cidade, grande ou pequena, dependem essencialmente do lugar que ela ocupa no sistema urbano, nacional e internacional.

Em muitas nações, certos tipos de indústria e de empresa de serviços estão se desenvolvendo em áreas rurais. Mas essas áreas vêm recebendo serviços e infra-estrutura de alta qualidade, com sistemas avançados de telecomunicações, que fazem com que sua atividades sejam parte integrante do sistema urbano-industrial nacional e global. De fato, o interior está sendo “urbanizado” cada vez mais aceleradamente.

O século XX é o da “revolução urbana”. Depois de 1950, o número de pessoas que vivem nas cidades quase triplicou; nas regiões mais desenvolvidas, a população urbana dobrou; no mundo menos desenvolvido, quadruplicou.

Em muitos países em desenvolvimento, as cidades têm crescido muito além do que jamais se poderia imaginar. Poucos governos de cidades do mundo em desenvolvimento, cujas populações crescem a um ritmo acelerado, dispõem de poderes, recursos e pessoal treinado para lhes fornecer as terras, os serviços e os sistemas adequados a condições não-degradantes de vida: água potável, saneamento, escolas e transportes.

O resultado disso se revela na proliferação de assentamentos ilegais de habitações toscas, nas aglomerações excessivas e na taxa de mortalidade altíssima, decorrente de um meio ambiente insalubre, por causa de problemas de infra-estrutura deteriorada, degradação ambiental, decadência do centro urbano e descaracterização dos bairros.

Os desempregados, os idosos e as minorias étnicas e raciais podem mergulhar numa espiral descendente de degradação e pobreza, pois as oportunidades de emprego diminuem, e os indivíduos mais jovens e mais instruídos vão abandonando os bairros decadentes.

No mundo industrializado, as cidades também são responsáveis por problemas de alcance global, tais como o consumo de energia e a poluição ambiental. Muitas delas obtêm seus recursos e sua energia de terras distantes, com fortes impactos coletivos sobre essas terras distantes.

Em geral, o crescimento urbano muitas vezes vem antes do estabelecimento de uma base econômica sólida e diversificada para apoiar o incremento da infra-estrutura, da habitação e do emprego. Em muitos lugares, os maiores problemas estão ligados a padrões inadequados de desenvolvimento agrícola e urbano.

A crise econômica mundial dos anos 80 não resultou somente em menores rendas, maior desemprego e na eliminação de muitos programas sociais. Ela também diminuiu drasticamente a já baixa prioridade dada aos problemas urbanos, aumentando a deficiência crônica dos recursos necessários para construir, manter e administrar as cidades.

As interações urbanas contemporâneas

Os sistemas urbanos constituem redes, formadas por um conjunto hierarquizado de cidades com tamanhos diferentes, ou seja, onde se observa a influência exercida pelos centros maiores sobre os menores. A hierarquia urbana se estabelece a partir dos produtos e dos serviços que as cidades têm para oferecer. Quanto mais diversificada for a economia de uma cidade, maior será a sua capacidade de liderar e influenciar os outros centros urbanos com os quais mantém relações.

Assim se cria um sistema de relações no qual as cidades mais desenvolvidas lideram a rede urbana. As cidades maiores influenciam as cidades médias, e estas influenciam as cidades menores.

As metrópoles correspondem a centros urbanos de grande porte: populosos, modernos e dotados de graves problemas de desigualdades sociais. Nelas predomina o trabalho assalariado, que, aliado ao tamanho da população, contribui para a formação de um significativo mercado consumidor. Para atender a esse mercado, os estabelecimentos comerciais se multiplicam e as redes de prestação de serviços de toda espécie se ampliam, o que configura um grande desenvolvimento do setor terciário da economia.

A concentração populacional amplia a oferta de mão-de-obra e, desse modo, atrai investimentos produtivos que contribuem para o desenvolvimento da indústria, com a expansão do setor secundário não apenas na metrópole, mas também nas regiões circunvizinhas.

Quando os limites físicos das cidades estão muito próximos, formam-se conurbações. Isso ocorre principalmente nas regiões mais desenvolvidas, onde geralmente há uma grande rodovia, um porto ou sistemas de comunicação aperfeiçoados que expandem continuamente a área física das cidades.

Ao contrário do que normalmente se considera, a megalópole não é uma megametrópole, mas uma conurbação de metrópoles. É encontrada em regiões de intenso desenvolvimento urbano, e nelas as áreas rurais estão praticamente ausentes.

As principais megalópoles contemporâneas são: Boswash. (localiza-se no nordeste dos Estados Unidos); Chipits,(também está localizada nos Estados Unidos, ao sul dos Grandes Lagos); Tokkaido,(corresponde a uma das megalópoles mais populosas do mundo. Localizada no sudeste do Japão); Renana, (localizada na Europa ocidental, junto ao vale do Reno).

A urbanização corresponde principalmente a um processo de transferência de populações das zonas rurais para as cidades; quando ele é muito intenso, recebe o nome de êxodo rural.

Os países mais desenvolvidos - No século XIX, a urbanização foi mais intensa nos países que realizaram a Revolução Industrial e que constituem hoje países desenvolvidos. As novas possibilidades de trabalho na indústria e no comércio atraíram as populações da zona rural para as cidades.

No pós-guerra, a concentração humana e a elevação do poder aquisitivo das populações dos países mais desenvolvidos produzi­ram um grande aumento do consumo de bens e serviços, que favoreceu a expansão do setor terciário da economia. Como nesse período também ocorreu um grande desenvolvimento da tecnologia industrial, a produtividade aumentou e as necessidades de mão-de-obra se reduziram.

Os países subdesenvolvidos - O século XX se caracterizou pela urbanização dos países subdesenvolvidos. O ritmo se acelerou a partir de 1950, devido ao aumento das taxas de crescimento populacional e, em muitos desses países, à industrialização, propiciada pelos significativos investimentos das empresas multinacionais. Formaram-se grandes cidades, para as quais as populações da zona rural se deslocaram em busca de melhores condições de vida, pois era ali que a industrialização estava mais presente, com maior disponibilidade de emprego, conforto e ascensão social.

Nessas cidades, contudo, a industrialização adotou um padrão tecnológico muito mais moderno do que o utilizado pelas indústrias do século XIX, o que resultou na criação de menos empregos. Por isso, mui­tas pessoas que se deslocaram para as cidades não encontraram trabalho e passaram a viver em situação de extrema pobreza, em locais insalubres, como favelas e cortiços sem luz, água, rede de esgotos, transportes coletivos e demais serviços urbanos.

Por isso, nessas cidades o setor terciário informal - aquelas atividades não-regulamentadas, como a dos camelôs e biscateiros - cresce mais que o formal. Essa situação é chamada de hipertrofia do terciário.

América Latina - É a região mais urbanizada entre o conjunto dos países menos desenvolvidos e, desde o início da década de 1970, a população urbana é superior à população rural.

Essa região foi a primeira a conquistar a independência política, a constituir uma economia de mercado e a desenvolver atividades industriais, ainda durante o século XIX. Desde o início do século XX, e principalmente após 1940, outros fatores contribuíram para acelerar a urbanização.

A concentração de terras herdadas do período colonial se perpetuou no latifúndio, o que agravou a pobreza rural e estimulou a população de origem camponesa a migrar para as cidades. Além disso, muitas propriedades rurais se modernizaram, adotando procedimentos administrativos característicos das grandes empresas urbanas e passando a utilizar máquinas agrícolas em grande escala, que reduziram a necessidade de mão-de-obra.

Em quase toda a América Latina, os índices de urbanização são elevados, com a população urbana ultrapassando 70% na maior parte dos países, com exceção da região da América Central, da Bolívia e do Paraguai.

A urbanização da África - A maior parte da população vive na zona rural, pois as atividades agrárias predominam na estrutura econômica de quase todos os países do continente.

Mesmo assim, desde o início da década de 1970 os países da África são os que apresentam as taxas de urbanização mais eleva­das entre os países menos desenvolvidos, com um aumento superior a 5% ao ano. Em 1960, a população urbana da África correspondia a 210 milhões de habitantes; hoje corresponde a mais de 420 milhões.

O ritmo de transferência de populações do campo para a cidade é crescente, e para isso contribui o grave estado de pobreza da maior parte das sociedades africanas. Cerca de 216 milhões de pessoas, ou 47,8% da população absoluta, vivem abaixo da linha de pobreza delimitada pela Organização das Nações Unidas (ONU), com uma renda anual inferior a 370 dólares.

A urbanização africana está relaciona­da com a ampliação da economia de exportação, a partir de 1950, quando houve um grande aumento do consumo mundial de matérias-primas, combustíveis fósseis e produtos agrícolas.

As áreas de urbanização mais acentua­da são a República da África do Sul, um país industrializado; os países que se localizam em torno do golfo da Guiné, com sua indústria petrolífera; e a região do litoral do mar Mediterrâneo, de onde parte importante ro­ta marítima internacional, o que lhe permite manter uma forte integração econômica com os países europeus.

A urbanização na Ásia - O continente mais populoso do mundo, não tem uma tradição urbana. A população ainda é predominantemente rural, mas desde a década de 1960 a migração do campo para as cidades aumentou muito os índices de urbanização.

Calcula-se que no início do século XXI cerca de 2 bilhões de asiáticos estarão vivendo em cidades, o que pode significar o aumento da pobreza. Hoje, a situação já é dramática. Na Índia e em Bangladesh, na Ásia meridional, cerca de 562 milhões de pessoas, ou 49% da população, vivem com uma renda anual inferior a 370 dólares por habitante, tal como no continente africano.

A industrialização dos países conhecidos como tigres asiáticos (Coréia do Sul, Taiwan, Cingapura e Hong Kong), ocorrida nas últimas décadas, e a recente ascensão econômica dos chamados novos tigres (Malásia, Tailândia, Indonésia e Filipinas) aumentaram a oferta de trabalho, transformaram suas principais cidades em pólos de forte atração populacional e contribuíram para acelerar a urbanização asiática.